Imagem via Soreth, Dickson e Terry (2017)
Jordana Fontana
No mês em que celebramos o dia internacional das mulheres e meninas na ciência, é justo também discutirmos grandes nomes de cientistas do campo da análise do comportamento. A filosofia comportamentalista, que desde os primórdios se preocupou com a construção de uma sociedade melhor, não poderia deixar de lado discussões sobre igualdade entre gêneros e feminismo. No entanto, o comportamentalismo só aderiu essa linha de pesquisas devido à influência de Maria del Rosario Ruiz.
Maria nasceu em Cuba, em 1950. Com o governo comunista de Fidel Castro e um pânico coletivo de que o governo planejava enviar menores de idade para a União Soviética, muitos pais enviaram seus filhos para os Estados Unidos – e Maria foi uma dessas crianças. Aos 11 anos, foi para Miami e viveu em um abrigo por 3 anos, até que seus pais tivessem condições para emigrar de Cuba. Depois disso, a família se mudou para Orlando e Maria iniciou sua graduação na Universidade da Flórida, tendo titulação de mestra em educação especial, seguindo com a titulação de mestra e PhD em psicologia. Após uma trajetória acadêmica pesquisando sobre temas variados, assumiu uma posição na Universidade de Rollins em 1980, sendo a primeira professora mulher no departamento de psicologia.
Pioneira nos estudos de feminismo no escopo teórico da análise do comportamento, Maria escreveu artigos demonstrando o quanto a própria psicologia contribui para o silenciamento de vozes de mulheres cientistas a partir de discursos predominantemente masculinos presentes na ciência. Discutiu sobre a patologização de comportamentos femininos enquanto há uma negligência da percepção de fatores de gênero e opressão envolvidos nas demandas clínicas. A autora pontuava algumas convergências importantes entre o feminismo e o comportamentalismo e acreditava que a análise do comportamento poderia ser uma ferramenta útil na luta feminista. Fez uma chamada para que analistas do comportamento se engajassem em pesquisas que discutissem a opressão vivida por mulheres, já que a ciência não é neutra e a atividade científica é política no sentido de que deve encontrar soluções para problemas sociais.
Além de suas contribuições conceituais, Maria deixou um legado como professora e mentora. Ficou conhecida por suas habilidades de ensinar e pela capacidade de fazer com que alunos sentissem que sempre tinham algo valioso a compartilhar. Foi engajada com diversos grupos marginalizados, mulheres, imigrantes, pessoas com deficiência, crianças autistas e a comunidade LGBTQIA+.
As publicações da autora abriram espaço para novos desdobramentos e elaboração de diferentes pesquisas incluindo discussões de gênero, patriarcado e feminismo no escopo da análise do comportamento. Essas pesquisas têm contribuído para que a análise do comportamento alcance seu papel social – o de contribuir para a construção de uma sociedade melhor, com mais igualdade e justiça social. Para Maria, a análise do comportamento era uma forma de ativismo político.
Maria dedicou boa parte da sua vida à ciência do comportamento. Ela faleceu em casa na manhã do dia 15 de agosto de 2017, após um longo período de luta contra o câncer. Em seus últimos pedidos, requisitou que seus alunos fossem presenteados com sua coleção de livros. Ex-alunos relembram de uma placa que ficava em seu escritório, na qual constava a frase “no whining” (sem choramingos), relembrando que não há tempo para nada além de ações efetivas. Isso faz com que Maria seja lembrada como alguém que ensinou o valor de dedicar a vida para fazer tudo o que se pode para salvar o mundo no pouco tempo que temos aqui. Uma mulher e cientista que deixou um legado de sensibilidade, conhecimento e contribuições para um mundo melhor.
Rosendo, A. P., & Nogueira, C. P. V. (2020). Feminismo e Análise do Comportamento: Contribuições de Maria R. Ruiz. Id online: Revista Multidisciplinar e de Psicologia, 14(49). doi: 10.14295/idonline.v14i49.2344
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