domingo, 21 de abril de 2024

Clube da Caçamba - um projeto de divulgação de conhecimento científico da UEL: minha experiência de coordenação



Verônica Bender Haydu

     Durante a pandemia da Covid-19, os/as quatro estagiários(as) que eu supervisionava, assim como todos os estudantes do nosso país e de países afetados pela pandemia, não puderam realizar seus estágios obrigatórios. Isso levou aqueles(as) que estavam sob a minha supervisão, depois da elaboração de três projetos não executáveis, a proporem o desenvolvimento de páginas em mídias sociais para a divulgação de conhecimento científico. A proposta inicial focalizou a produção de postagens (reels e carroceis) sobre a gestão de resíduos sólidos da construção e demolição civil, por isso, o nome "Clube da Caçamba".

A proposta considerou como relevante o fato de o impacto das mídias sociais ser significativo para a divulgação de uma grande variedade de temas. No Brasil, por exemplo, havia no início de janeiro de 2023181,8 milhões de usuários de Internet, cerca de 84,3% da população brasileira, dos quais 152,4 milhões são usuários de mídias sociais, totalizando cerca de 70% da população (Kemp, 2023). Devido a esse potencial, divulgar conhecimentos científico e buscar a inserção social de acadêmicos na comunidade em geral, nos pareceu uma excelente forma de atuação de estagiários do curso de Psicologia.

 A divulgação por meio das redes sociais possibilita disseminar informações científicas para quem tem acesso a esse tipo de mídia, favorece a formação de equipes e a articulação da realidade dos estudantes com a comunidade. O trabalho de estágio de uma estudante das que propuseram o Clube da Caçamba continuou no ano seguinte, enquanto novos estudantes ingressaram e passaram a atuar, agora na modalidade “Atividade Acadêmica Complementar”. No entanto, para formalizar mais apropriadamente o que vinha sendo realizado, senti necessidade de transformar nossas atividades em um projeto de extensão. Assim, fiz o cadastro do projeto na Pró-Reitoria de Extensão da UEL, com o seguinte título “Clube da Caçamba-UEL: Promovendo Contingências Comportamentais Entrelaçadas e a Divulgação por Mídias Sociais de Conteúdos Relevantes para a Educação Ambiental”. Nessa ocasião, contávamos com a participação de 12 estudantes de graduação, um doutorando e uma estagiária de pós-doutorado.

O projeto de extensão Clube da Caçamba continua focalizando a questão da gestão de resíduos, mas agora se estende aos mais variados temas relacionados à preservação ambiental e ao desenvolvimento sustentável. Uma meta que surgiu ao longo de seu desenvolvimento foi fornecer modelo para que projetos semelhantes possam ser criados por estudantes e professores de outras instituições de ensino. Para isso, foi desenvolvido um manual (Haydu et al., 2024) e a divulgação desse modelo tem sido feito em eventos científicos, como no Encontro Anual da ABPMC, no Congresso de Psicologia da UEL, e em entrevistas como na Webinar Psico Sustentável.

Atualmente, o Clube da Caçamba conta com a participação de 15 estudantes de graduação, tendo havido o desligamento de alguns enquanto novos membros passaram a fazer parte. Além dos estudantes de graduação, contamos atualmente com três pós-graduandos do Programa de Pós-Graduação em Análise do Comportamento, duas professoras e um professor do Departamento de Psicologia Geral e Análise do Comportamento. Essa ampliação e o seu funcionamento permitiu descrever o projeto como uma metacontingência (ver Haydu et al., 2024), estabelecida pela promoção do entrelaçamento de contingências entre os comportamentos de estudantes, de professores e de seguidores das páginas da Internet, seus produtos agregados e as consequências culturais produzidas.

Coordenar o Clube da Caçamba tem sido uma experiência muito gratificante, principalmente no que se refere ao envolvimento dos estudantes e a empolgação que mostram com as possibilidades que o projeto tem oferecido. Descrever e compreender as interações dos membros do projeto em termos de metacontingência, bem como, avaliar como ela se estabeleceu e se modifica ao longo do tempo, tem sido uma experiência muito gratificante que pode resultar em desdobramentos relevantes para a análise comportamental da cultura.

 Referências

Haydu, V. B., Celli, L., da Costa Júnior, E. M., Santos, D. S., & Melo, C. M. (2024). Manual do projeto de extensão Clube da Caçamba. UEL. https://www.researchgate.net/publication/377889833_manual_do_projeto_de_extensao_clube_da_cacamba

 Haydu, V. B., Melo, C. M., Maia, N. N., Celli, L., Macedo, R. P., & de Freitas, M. C. (2024). Desenvolvimento sustentável e análise do comportamento: entrelaçamento de contingências comportamentais para a educação ambiental. W. L. Filho et al. (Orgs.), A Teoria e a Prática de Desenvolvimento Sustentável (pp. 20-28). Rima.

Kemp, S. (2023). Digital 2023: Brazil. https://datareportal.com/reports/digital-2023-brazil?rq=DIGITAL%202023%3A%20BRAZIL

 

sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Memória: lembrar e esquecer

  Ilustração gerada pela Inteligência Artificial “DALL·E”, modificada em 05/01/2024

 

Verônica Bender Haydu    

Quando falamos em lembrar ou esquecer pensamos em memória, que por sua vez, nos faz pensar em recuperar, armazenar, imaginar, codificar e outros termos desse tipo. Essas expressões fazem parte de nossa linguagem coloquial e estão relacionados a uma forma de conceituar memória como sendo um lugar, um espaço ou uma parte do cérebro onde as informações estão armazenadas. A memória é ainda, com freqüência, considerada como sendo um construto que mantém status físico, assumindo função causal. Por exemplo, considera-se que as pessoas se comportam de determinadas formas porque têm ou não têm uma boa memória.

Essas formas de conceituar memória diferem da forma como o analista do comportamento o faz, pois, em princípio, o sujeito nesta visão é o locus onde variáveis independentes manipuláveis têm seus efeitos e não o locus de onde o comportamento emerge. E devido às implicações estruturalistas do termo memória, ele é evitado pela maioria dos analistas do comportamento, sendo os termos lembrar e recordar mais usados. Esses termos – lembrar e recordar - deixam claro que estamos nos referindo a um processo e não a uma estrutura, ou seja, que nosso objeto de estudo é um comportamento.

Considerar memória como um comportamento permite analisá-lo funcionalmente e permite, portanto, predição e influência. A análise funcional de um comportamento consiste em observar e descrever as relações que o organismo mantém com o ambiente, havendo a necessidade da descrição do comportamento emitido e de como ele é colocado e/ou mantido sob o controle de estímulos. A análise pode ser de comportamentos dos outros ou do próprio comportamento e pode ser de comportamentos abertos ou encobertos. Há ainda, a possibilidade de serem os comportamentos sob análise, eventos atuais ou eventos vivenciados anteriormente. Assim, o próprio indivíduo pode estar se comportando e ser aquele que analisa funcionalmente o comportamento.

A análise funcional do comportamento permite, portanto, identificar as variáveis das quais o comportamento é função e arranjar as contingências ambientais para aumentar a probabilidade de recordar um fato ou um comportamento esquecido. Ou seja, emitir respostas precorrentes do recordar que levam à alteração das condições ambientais e tornam a resposta a ser recordada mais provável. 

Para leitura adicional ver:

Aggio, N. M., & Varella, A. A. B. (2012). A memória e a retenção da aprendizagem por pessoas com Deficiência Intelectual. DI-Revista de Deficiência Intelectual, 3(2), 20-23. https://www.calameo.com/read/0013472525e8d0cc50a5b

Aggio, N. M.; Varella, A. A., Silveira, M. V., Rico, V. V., de Rose, J. C. C. (2014). Memória sob a ótica analítico comportamental. In L. M. H. Sadi & C. Vichi. (Org.). Comportamento em Foco (v. 14, p. 421-432). ABPMC. https://abpmc.org.br/comportamento-em-foco/

Leite, E. F. da C., & Micheletto, N. (2019). Criatividade para Skinner como um comportamento complexo encadeado: semelhanças e diferenças com resolução de problemas, autocontrole, tomada de decisão e recordar. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 21(3), 372–389. https://doi.org/10.31505/rbtcc.v21i3.1325