quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Ratos ansiosos: como o rato descobre que está num lugar perigoso?

Celio Estanislau

Abordar problemas do comportamento humano por meio de estudos com animais é tarefa que vem ocupando pesquisadores mundo afora por décadas. Foi assim que Pavlov descreveu o condicionamento reflexo, noção importante para se falar, por exemplo, de emoções. Foi assim que Thorndike, e depois, Skinner, identificaram as formas como hábitos são estabelecidos em suas relações com contextos e com consequências. Foi assim que Donald Hebb demonstrou melhoras de desempenho resultantes da vida em ambiente enriquecido.
Os estudos com animais também têm sido usados para se levantar informações relevantes para a compreensão de transtornos comportamentais. Nesse sentido, nas últimas décadas pesquisadores têm criado procedimentos tomando proveito de tendências naturais que os animais apresentam. A observação cuidadosa permitiu a identificação de situações que naturalmente (sem treino prévio) tornam animais mais cautelosos e hesitantes. Essas situações se mostraram úteis para o estudo da ansiedade.

Como saber se um rato está ansioso?

Quando alguém diz que está estudando depressão ou ansiedade em ratos, a pergunta que qualquer pessoa com treino científico fará instantaneamente é “Como é que você sabe?”. O ceticismo é uma postura que está na essência da prática científica e foi com essa postura que os pesquisadores do que ficou conhecido como “modelos animais” olharam para seu próprio objeto de estudo. Dessa forma, uma vez que não se poderia aceitar meras alegações de que o ratinho tá com cara de “desanimadinho” ou “assustadinho”, foi necessário lançar mão de ferramentas mais objetivas para a validação dos modelos.
A saída seria algo que sabidamente alterasse o grau de ansiedade nas pessoas e pudesse ser usado com animais. Drogas ansiolíticas foram a resposta.
Diversos modelos animais de ansiedade foram concebidos e validados com drogas ansiolíticas. O mais amplamente usado dentre eles é o labirinto em cruz elevado. Posto nele, o rato naturalmente apresentará comportamentos exploratórios (é o que ele faz em qualquer ambiente novo). Porém, essa tendência de exploração conflita com outra natural em ratos, que é a de permanecer próximo a paredes. Essa última supostamente foi uma resposta evolutiva que roedores desenvolveram à predação aérea. Assim, dentre os espaços disponíveis no labirinto, os chamados ‘braços abertos’ (áreas não circundadas por paredes), tipicamente, são pouco visitados por ratos. A não ser que... ele esteja sob efeito de um ansiolítico.
 Embora aparentemente essa evitação natural de roedores seja algo simples, ela ainda é envolta em mistério. Uma questão simples como “O rato usa mais a visão ou o tato para avaliar se o espaço é próximo a paredes ou se é aberto?” ainda não está plenamente respondida. Obviamente, ambos os sentidos são importantes em diversos tipos de situações. Mas, enquanto ferramenta da neurociência, o labirinto em cruz elevado será tanto mais útil quanto melhor se souber sobre as vias sensoriais necessárias para a esquiva dos braços abertos.

Foi em busca de respostas sobre esse tema que foi desenvolvido o trabalho de mestrado de Guilherme B. Filgueiras. Com manipulações simples, tais como manipular a presença ou não de paredes, usar paredes transparentes ou opacas e cortar ou não os bigodes (também chamados de vibrissas, são uma via tátil importante em roedores) dos ratos, o estudo de Filgueiras sugere que, da forma como o teste costuma ser feito, a visão não é tão importante assim. (Vale a pena abrir parênteses para dizer que isso não significa que no escuro os ratos se comportariam da mesma forma).

Recentemente, uma empresa dos EUA de automação de equipamentos de laboratório (MazeEngineers) dedicou um espaço em seu blog a descrever os principais resultados de Filgueiras.

Saiba mais:

Agradecimento: A pesquisa foi realizada com recursos do CNPq (proc. 400735/2009-1).