quarta-feira, 28 de abril de 2021

Como a gamificação pode transformar alunos em agentes secretos, fadas ou piratas motivados a aprender

 

Fabiana Paula Fieldkircher

            É urgente a necessidade de adaptação do sistema de ensino ao contexto do século XXI, como revela a crescente busca dos educadores pelas chamadas metodologias ativas. Os métodos ainda utilizados na Educação não foram desenvolvidos para os estudantes de hoje, chamados por Prensky (2001) de “nativos digitais”. Na escola, encontram um ambiente diverso daquele em que permanecem na maior parte de seus dias. Estão habituados a acessar as informações e os conteúdos que mais lhe aprazem, seja por interesse ou diversão, com a acentuada velocidade proporcionada pela internet – o que a maioria faz pelo seu próprio dispositivo eletrônico (Cetic, 2018). Fica difícil para a escola competir com as dinâmicas e interativas telas. Uma das estratégias que pretendem diminuir a disparidade entre os dois contextos é a gamificação de atividades educacionais.

            Como o próprio termo sugere, gamificar é tornar algo mais semelhante a um jogo, e consequentemente, mais engajador (Aldemir et al., 2018; Özdener, 2018). A gamificação ocorre pela implementação de elementos encontrados no design dos jogos à contextos que não são jogos (Deterding, Dixon, Khaled, & Nacke, 2011). Ao implementar a “Narrativa” (um elemento de jogo – Werbach & Hunter, 2015) a uma atividade, por exemplo, o professor fornece um contexto para a tarefa que dá sentido às ações do aluno. A narrativa é a temática principal, a história que permeia o objetivo a ser alcançado, que determina as regras de um jogo e os seus motivos. O que é mais divertido e desafiador: uma atividade em que o aluno é  um agente secreto que tenta descobrir qual é o vilão que está causando a degradação ambiental do planeta ao desvendar pistas e charadas que se autodestroem em segundos, ou uma tarefa em que precisa fazer uma lista dos fatores que causam aquecimento global? A depender da forma com que são planejadas e executadas, as duas atividades poderiam proporcionar o alcance de um objetivo de aprendizagem. Mas a primeira, gamificada, tem maior potencial de gerar engajamento.

            Um aluno engajado e ativo é essencial para a ocorrência da aprendizagem e é por isso que a gamificação tem tanto potencial no ensino. Se ao planejar as atividades e no momento de sua implementação o professor garantir que os alunos participem ativamente, poderá saber o quanto e se estão aprendendo, além de ter a oportunidade de oferecer um feedback imediato para os desempenhos mais adequados (Henklain & Carmo, 2013). A natureza divertida e desafiadora de uma atividade gamificada promove essa participação por meio da narrativa, que fornece contexto significativo às ações dos alunos, mas também das dinâmicas, que instigam a interação social (por meio, por exemplo da cooperação e competição), e das mecânicas, que estabelecem constrições e regras, além de  recompensar ações com itens funcionais ou colecionáveis e acúmulo de pontos.

            O estabelecimento de objetivos de aprendizagem e o feedback imediato, princípios também primordiais a serem aplicados no contexto educacional, são garantidos em uma atividade gamificada. Os objetivos  definem o que o aluno deve ser capaz de fazer ao fim da atividade e permitem que seja feita uma avaliação da eficiência do ensino, isto é, se estes objetivos foram atingidos (Botomé, 1977). O estabelecimento do objetivo de aprendizagem em uma atividade gamificada é garantido pelo fato de jogos essencialmente terem metas que definem um estado de vitória, o que não poderia ser diferente em uma atividade que implementa seus principais elementos. Com um fim pedagógico, a meta da atividade é atingida quando ocorre a aprendizagem. Já o feedback imediato, essencial por permitir a seleção e manutenção do desempenho esperado do aluno (Skinner, 1968/1972), é proporcionado pelas recompensas, sistemas de pontuação e até mesmo pelas informações sobre o progresso atingido ao longo de fases e níveis. Nas atividades gamificadas virtuais, ainda existe a vantagem deste feedback ser automático.

            Os jogos não são uma novidade, pois estão presentes em todas as culturas há séculos, sendo novas e contextuais apenas as suas diferentes formas de aplicação. A gamificação como implementação dos elementos dos jogos em atividades de ensino é resultado da busca de pesquisadores da Educação por metodologias capazes de gerar motivação e de conquistar a atenção dos estudantes de hoje. Mas apesar de no meio acadêmico os benefícios proporcionados pela gamificação já serem conhecidos, ainda resta tornar a sua implementação mais comum e natural por meio da disseminação deste conhecimento e da capacitação de professores. Mais do que nunca, se torna necessário entendermos que aprender pode ser uma atividade divertida e desafiadora.

Referências

Aldemir, T., Celik, B., & Kaplan, G. (2018). A qualitative investigation of student perceptions of game elements in a gamified course. Computers in Human Behavior, 78, 235–254. doi: 10.1016/j.chb.2017.10.001

Botomé, S. P. (1977). Atividades de ensino e objetivos comportamentais: No que diferem. [manuscrito não publicado].

Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic) (2018). Pesquisa sobre o uso da Internet por crianças e adolescentes no Brasil – TIC Kids Online Brasil.

Deterding, S., Dixon, D., Khaled, R., & Nacke, L. (2011). From game design elements to gamefulness. Proceedings of the 15th International Academic MindTrek Conference on Envisioning Future Media Environments – MindTrek ’11, 185(6), 9. doi:10.1145/2181037.2181040

Henklain, M. H. O. & Carmo, J. dos S. (2013). Contribuições da Análise do Comportamento à Educação: um convite ao diálogo. Cadernos de pesquisa, 43(149), 704-723

Özdener, N. (2018). Gamification for enhancing Web 2.0 based educational activities: The case of pre-service grade school teachers using educational Wiki pages. Telematics and Informatics, 35(3), 564–578. doi: 10.1016/j.tele.2017.04.003

Prensky, M. (2001). Digital Game-Based Learning. New York, NY: McGraw-Hill.

Skinner, B. F. 1968. The Technology of Teaching. New York: Meredith Corporation.

Werbach, K. & Hunter, D. (2015). The gamification toolkit: Dynamics, mechanics, and components for the win. Wharton Digital Press.

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