quarta-feira, 9 de julho de 2025

O Gaslighting sob a Ótica da Análise Comportamental

  

 

Inteligência Artificial “DALL·E”, modificada em 19/02/2025. 

Ariadne Barbieri Missiato

Verônica Bender Haydu 

Você já se perguntou o que mantém pessoas em relacionamentos abusivos? Uma das dinâmicas comuns nesses contextos é o gaslighting. Trata-se de uma forma de manipulação psicológica em que o agressor distorce a percepção da vítima sobre si mesma e o mundo ao seu redor, levando-a a questionar suas lembranças, percepções e julgamentos (Abramson, 2014). Essa prática afeta a confiança da vítima, fazendo-a duvidar de sua própria visão da realidade.

O fenômeno do gaslighting pode ser compreendido como uma forma de controle coercitivo. A coerção ocorre quando um indivíduo impõe seu domínio sobre outro por meio de contingências aversivas, que podem incluir punições, ameaças, manipulação verbal e extinção de comportamentos (Sidman, 1989). Esses conceitos auxiliam na compreensão de como o agressor modela o comportamento da vítima, diminuindo a variabilidade de seus comportamentos e reforçando uma dinâmica de poder desequilibrada.

O comportamento da vítima, muitas vezes, é mantido por meio de reforço negativo, ou seja, pela retirada de um estímulo aversivo, aumentando a frequência de determinado comportamento. No gaslighting, isso ocorre quando a pessoa ameaçada opta por se manter em silêncio para evitar punições, geralmente verbais (Moreira & Oliveira, 2023). Por exemplo, ela pode escolher não defender sua posição durante uma discussão por já ter sido rotulada como “irracional” em situações semelhantes anteriores. Esse tipo de consequência reforça a submissão e reduz sua capacidade de agir de forma diversa, perpetuando o ciclo de abuso.

O controle coercitivo ocorre, muitas vezes, por meio de punições verbais, com afirmações como: “você está inventando coisas” ou “isso nunca aconteceu”. A repetida negação dessas histórias inibe a capacidade da vítima de se expressar e até de confiar na visão que ela tem da realidade (Abramson, 2014). Outra forma de punição é a retirada de bens ou direitos, utilizada para impor controle sobre a vítima (Moreira & Oliveira, 2023), reforçando sua dependência e dificultando a resistência às narrativas impostas pelo agressor.

O gaslighting pode ser interpretado, ainda, como uma forma de controle cultural sutil e discreto, que fortalece relações de poder desiguais entre os gêneros (Fontana & Laurenti, 2020). A violência simbólica opera por meio de contingências como o reforço diferencial e o controle ético, desqualificando das ações e sentimentos da pessoa afetada. Ao desacreditar sistematicamente a vítima, prática que contribui para o desenvolvimento de crenças que diminuem sua autonomia, os privilégios e o acesso do agressor a reforçadores sociais são mantidos. Isso cria uma dinâmica que perpetua sistemas de dominação e dependência.

Referências

Abramson, K. (2014). Turning up the lights on gaslighting. Philosophical Perspectives, 28(1), 1–30. https://doi.org/10.1111/phpe.12046

Fontana, J., & Laurenti, C. (2020). Práticas de violência simbólica da cultura de dominação masculina: Uma interpretação comportamentalista. Acta Comportamentalia, 28(4), 499–515. https://doi.org/10.32870/ac.v28i4.77327

Moreira, J., & Oliveira, P. (2023). Gaslighting e análise do comportamento: O reforçamento negativo como mecanismo de controle. Revista de Psicologia e Comportamento, 12(3), 45–59. https://doi.org/10.18761/pac29a09

Sidman, M. (1995). Coerção e suas implicações. Editorial Psy.

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