terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Estudo é coisa séria! Como podemos ajudar uma criança a estudar?


Valquiria Maria Gonçalves

      “Aquele aluno não gosta de estudar!”, disse a professora. “Nossa, minha filha não quer estudar!”, lamentou a mãe. “Eu não gostava de estudar quando era criança e acho que não sirvo para isso até hoje!”, disse o estudante universitário. Será que a gente ou nasce gostando de estudar ou não tem jeito mesmo? É possível aprender a estudar ou melhorar nossas formas de estudar? E como podemos ajudar nossas crianças (e futuros adultos) a estudarem de modo mais eficaz e a gostarem disso?
      De acordo com Cortegoso e Botomé (2002), boa parte das dificuldades encontradas no contexto acadêmico, profissional e social relacionam-se a um repertório de comportamentos de estudo deficitário. Apesar de não ser ensinado diretamente, salvo poucas exceções, somos cobrados a estudar desde a educação infantil até o ensino superior. Nesses contextos de aprendizagem, parece que o estudar é muito mais visto como algo natural, que de alguma forma cada pessoa desenvolveria ao longo da educação formal, do que como um comportamento que seria objetivo do ensino em si (Kienen et al., 2017). Parece que com frequência, ao longo da nossa trajetória educacional, nos é ensinado português, matemática, ciências, mas não especificamente como estudar português, matemática e ciências, não é?
      Dessa forma, como podemos ajudar crianças a estudar e tornar esse momento de estudo algo mais prazeroso? Primeiro, é importante compreender que estudar envolve vários comportamentos: desde prestar atenção ao que a professora apresenta nas aulas, fazer anotações, ler textos, compreender enunciados de questões e de exercícios e resolvê-los, até aspectos relacionados à organização do local de estudo e do gerenciamento do tempo para estudar, bem como o monitoramento do progresso no estudo. Ou seja, estudar é algo complexo, resultante de um processo de aprendizagem, e que pode ser ensinado (sim!) e aperfeiçoado (também!) (Coser, 2009). A partir do conhecimento científico produzido a respeito do estudar, pode-se utilizar algumas estratégias para auxiliar nossas crianças antes, durante e depois do estudo, que aumentam as chances de sucesso nesse processo, colaborando para manter crianças (e adultos!) motivadas a estudar e a aprender cada vez mais.
      Auxiliar a criança a organizar um local adequado para estudar é o primeiro passo. Um local com boa iluminação e que possua mesa e cadeira confortáveis para estudar é bastante importante. Outro fator importante é que os materiais de estudo estejam organizados, para isso pais, cuidadores e professores podem incentivar os estudantes a organizá-los. É importante também que estejam disponíveis somente os materiais que serão necessários à realização da atividade de estudo naquele momento, para evitar distrações e não dificultar mais a tarefa. Por falar em distrações, estudar com a TV ligada ou tendo acesso a celular e brinquedos variados pode não ser uma boa ideia, pois podem desviar a atenção para coisas concorrentes ao estudo. Um ambiente mais silencioso favorece o foco no estudar.
      Feito isso, vamos ao segundo passo: dedicar-se ao estudo como parte da rotina. Todo dia estudar um pouquinho, até que vire um hábito. A participação dos adultos é importante para junto às crianças estabelecer um horário para estudar e realizar as tarefas. A dica vale também para professores: incluam períodos de estudo nas aulas, aproveitando esses momentos para ensinar também como estudar. Ler, reler, identificar e anotar dúvidas, destacar palavras desconhecidas, fazer desenhos, fazer resumos, explicar o que aprendeu, perguntar, pesquisar, esclarecer dúvidas, descobrir coisas novas... Há uma imensidão de atividades e estratégias para estudar! Com o auxílio de adultos, as crianças podem ser incentivadas a “colocar a mão na massa”, bem como obter ajuda para conferir exercícios, aprender a identificar erros, poder corrigi-los e esclarecer dúvidas por meio de pesquisas ou consultando professores e colegas.
      Por fim, é necessário monitorar o progresso no estudo. Converse com a criança sobre o que ela aprendeu. A partir de alguns questionamentos é possível auxiliá-la a identificar possíveis dificuldades que teve no processo de estudar ou se ficou com alguma dúvida também. Como foi estudar? Foi fácil? Foi legal? Foi chato? Deu tempo de estudar o que queria e/ou precisava? Teve alguma coisa que atrapalhou o estudo (por exemplo, barulhos ou fazer a atividade correndo para poder brincar)? O que dá para fazer para ser mais fácil e mais legal? Como superar as dificuldades? As respostas a esses questionamentos auxiliam o estudante a avaliar, junto com pais, outros cuidadores e professores, formas de estudar que estão funcionando e poder pensar em melhorias para continuar se aprimorando na incrível arte de estudar.
      Dica final: vamos nos atentar que as percepções e atitudes dos adultos com relação ao estudo também influenciam nas percepções e ações das crianças com relação ao estudar! Não se esqueçam de reconhecer os esforços da criança, de valorizar o processo de estudar e de celebrar os avanços na aprendizagem desses comportamentos e em direção à autonomia do estudante!

Bons estudos a todas e todos!

Cortegoso, A. L., & Botomé, S. P. (2002). Comportamentos de agentes educativos como parte de contingências de ensino de comportamentos ao estudar. Psicologia: Ciência e Profissão, 22(1), 50-65. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-98932002000100007

Coser, D. S. (2009). Avaliação de programa para capacitar pais como agentes de promoção de comportamentos de estudo. Dissertação de mestrado não publicada. Programa de Pós-Graduação em Educação Especial, Centro de Educação e Ciências Humanas, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP. Recuperado de http://repositorio.ufscar.br/handle/ufscar/3029

Kienen, N., Sahão, F. T., Rocha, L. B., Ortolan, M. L. M., Soares, N. G., Michelato Y., S., & Prieto, T. (2017). Comportamentos pré-requisitos do “Estudar textos em contexto acadêmico”. Rev. CES Psico, 10(2), 28-49. http://dx.doi.org/10.21615/cesp.10.2.3

Nenhum comentário:

Postar um comentário